Covid-19 no Brasil: entre o autoritarismo, negacionismo, vulnerabilidades e a crise política.
Apesar de Você
Hoje você é quem manda
Falou, tá falado
Não tem discussão, não
A minha gente hoje anda
Falando de lado
E olhando pro chão, viu
Você que inventou esse estado
E inventou de inventar
Toda a escuridão
Você que inventou o pecado
Esqueceu-se de inventar
O perdão
Apesar de você
Amanhã há de ser
Outro dia...
Chico Buarque 1970.
A composição de Chico Buarque é de 1970 e atuou
diretamente aos anos vividos pela ditadura militar dentro do território
brasileiro. De acordo com Sobreira (2016), a canção “Apesar de você”, confirmava
a insatisfação da população e do artista com o status quo do país em plena
ditadura militar, e também, fazia alusão à esperança de mudança. O hino contra
o autoritarismo se mostra tão atual e tem muito a ver com o momento presente e
a degradação política que chegou ao Brasil com esse governo no qual estamos
vivendo, ou melhor, “tentando sobreviver”.
A antropóloga Lilia Schwarcz, reflete sobre a questão da democracia no
Brasil, no qual ela enfatiza que, mesmo sem ter dado um golpe de Estado, as
ações autoritárias de Bolsonaro estão aos poucos corroendo a Constituição e a
democracia. A postura política do atual presidente da República diante da
pandemia é tão assustadora, onde ele rejeita e descarta os pobres e acredita
que os idosos também devem morrer, tal posicionamento, retrata a promoção do
eugenismo.
Segundo Carvalho (2020), o momento agora não é de uma disputa política, muitas famílias estão enterrando seus mortos sem ter despedida. Pessoas estão morrendo nas ruas, nas portas de hospitais. Antes da pandemia, já tínhamos um problema sério na perspectiva econômica e a questão econômica é fundamental, pois quando não vai bem, gera desigualdade social com o aumento da pobreza, suscitando a violência e marginalização. Outro fator assustador é o negacionismo, presente nesse período, representando um prejuízo gigantesco para o enfrentamento da COVID-19, onde mesmo diante de tantas evidencias cientificas e recomendações de especialistas, muitos políticos insistem em soluções milagrosas, caminhando na contramão da ciência. Esse negacionismo, adotado pelo atual governo até mesmo nas campanhas eleitorais, indo contra as universidades, pesquisa cientifica, LGBTs, mulheres, populações vulneráveis e etc. Isso tudo acaba tomando uma proporção muito maior no período da pandemia, esse negacionismo se traduz na aceitação de intervenções sem validação cientifica, como é o caso da cloroquina, que o governo está fazendo uma divulgação e prometendo uma eficácia não comprovada, contrariando a Organização Mundial da saúde. Isso tudo representa um enorme atraso para o País.
Vulnerabilidades
frente ao Covid-19 e políticas públicas
O termo vulnerabilidade
historicamente está de alguma forma atrelado àquilo que se chamou de infecção
por HIV desde a década de 1990 no Brasil; porém antes dessa visão para as vulnerabilidades
estarem mais claras em meio aos pesquisadores e equipes de saúde, o olhar que
se tinha frente ao HIV-Aids era epidemiológico e puramente infectológico, ou
seja: contemplava-se números e preconceituosamente o que se chamava de grupos
de risco. Com o alcance da idéia de vulnerabilidades houve maior consciência de
que quaisquer seres humanos estavam vulneráveis frente à possibilidade de
infecção. Daí a amplificação dos modos de se estar vulnerável perante qualquer
infecção: Vulnerabilidade individual, social e institucional (MEYER et. al, 2006). Desse
modo toda a sociedade estaria co-responsável de modo coletivo pelo alastrar das
infecções como também pelo cuidado e prevenção. No atual contexto em que vivenciamos a triste condição da
Covid-19 corremos o risco enquanto sociedade em insistirmos exclusivamente e
olharmos para a atual pandemia tão somente com olhar infectológico. Desse modo
parece ser mais fácil contabilizarmos números ao invés de vidas, pessoas e
histórias; talvez como modo de negação de que milhares de famílias e de pessoas
das mais variadas classes sociais se encontram em sofrimento e vulneráveis
diante da mortandade do novo Coronavírus (VIEIRA et al., 2020).
As crenças distorcidas, políticas e ideológicamente contribuem
consideravelmente para a vulnerabilização da sociedade diante de um vírus
mortal, e nutre a fantasia de que a possibilidade de infecção está longe de
si.Tal argumento possui aspectos preconceituosos, os quais, assim como todos ou
outros aspectos aqui citados, tornam individualmente e socialmente vulneráveis
aqueles que assim idealizam, prova disso é o próprio comportamento social que
pode ser visto em diversas cidades do país, principalmente nos points de happy hour, pessoas de várias idades se
aglomerando e não fazendo o uso de mascaras denotando desprezo
e a irresponsabilidade social e coletiva, como também o imaginário de
que Covid-19 é algo que “não me atinge,
pois ‘tenho corpo atlético’”.
O conceito de vulnerabilidade
rompe com a limitação positivista e analítica e abre um universo de inúmeras
condições que pode tornar uma pessoa vulnerável diante do Coronavírus:
condições atreladas a graus de consciência, condições ambientais, históricas, sociais,
culturais, acesso a informações, práticas cotidianas, condições políticas e
institucionais e suas relações de poder. É inegável a vulnerabilidade dos vários grupos
sociais tais como: populações envelhecidas, populações com comorbidades, bem
como as minorias sociais a exemplo dos quilombolas, indígenas, moradores de rua
e imigrantes (VIEIRA et al., 2020).
[...] movimento de considerar a chance de exposição das pessoas ao adoecimento como a resultante de um conjunto de aspectos não apenas individuais, mas também coletivos, contextuais, que acarretam maior suscetibilidade à infecção e ao adoecimento e, de modo inseparável, maior ou menor disponibilidade de recursos de todas as ordens para se proteger de ambos [...] e aplica-se, rigorosamente, a qualquer dano ou condição de interesse para a saúde pública [...] (AYRES et al., 2003, p.123 e p.118).
As vulnerabilidades se potencializam quando os direitos humanos são negados ao âmbito de fatores individuais, no alcance intersubjetivo e identitário; quando os direitos humanos não sustentam em práxis os fatores sociais por meio das políticas e as questões concretas da comunidade como gênero e crenças; e quando esses não são aplicados a fatores institucionais por meio de políticas públicas e cidadania em operação efetiva na saúde, na mídia e nas relações institucionais; como é o caso do atual “representante” do governo brasileiro que, através de seu discurso perverso e negacionista, vulnerabilizou milhares de pessoas e ceifou mais de cem mil vidas.
Pandemia e Crise Política no Brasil
A pandemia do covid19 revela crise
não apenas no crescimento de tensões diplomática como também aguça disparidades
dentro de cada País, essa disparidade aponta o atraso ou ineficácia de ações
governamentais que traz como resposta o aumento do número de mortes e desastres
na economia, com elevação dos índices do desemprego, falência e miséria.
(Flavio Rocha de Oliveira – Fundação Lauro Campos). O avanço da pandemia escancara
as desigualdades entre os países e até mesmo dentro do próprio País no tocante
ao poder político, a capacidade econômica e tecnológica e as divisões entre as Classes
sociais e as etnias.
Nesse ínterim entre dezembro de 2019
aproximadamente a janeiro de 2020, percebe se uma nova era de competição de
novas potencias: China, EUA e Rússia, onde o interesse econômico prevalece
sobre a seriedade frente a uma cepa completamente nova de um vírus que poderia
ceifar muitas vidas. Constatada a seriedade e o avanço do vírus no mundo alguns
governantes tentando desviar atenção da opinião pública do fato de que havia
cometido erros grosseiros frente a pandemia, nesse momento há acusações mutua
entre as grandes potências citadas.
No Brasil, o presidente atual tenta
realizar um processo de alimento com a política externa Norte Americana, que
vem juntos com uma política doméstica de negação da importância e da gravidade
da doença, chegando a classificar como “Gripezinha”. Esse comportamento
resultou na perda preciosa de tempo em iniciar um tratamento, bem como adquiri
insumos necessários que faria toda diferença no tratamento inicial.
E
os imigrantes? Como são vistos perante essa pandemia. Observa-se que a câmara
de comercio (ICC) e a organização internacional para imigrações (IOM)
divulgarão no dia 10/08/2020 orientações para empregadores sobre medidas para
proteger os migrantes durante o Covid19 , visto que são suscetíveis a perda de
empregos, corte de salários e vários problemas de saúde segurança e frequentemente carecem de
proteção social considerando que estão longe das rede de apoio familiar e
enfrentam barreiras linguística e o culturais.
A secretaria Nacional de assistência social do ministério da cidadania decreta a portaria 69, de 14 de maio de 2020, garantindo lhes acesso a proteção de saúde, acolhimento, moradia provisória, acesso a um programa sociais e benefícios (Programa emergencial/ bolsa família), suporte higiênico entre outras. Esta portaria estabelece obrigações cada esfera governamental.
Referências Bibliográficas
AYRES, J. C. R. M. et al. O conceito de vulnerabilidade e as práticas de saúde: novas perspectivas e desafios. In: CZERESNIA, D.; FREITAS, C. M. de. Promoção da saúde: conceitos, reflexões, tendências. Rio de Janeiro, FIOCRUZ, 2003.
Entrevista com o músico Ernesto José de Carvalho. Na ditadura e na pandemia há muita dor, mas também muitos dispostos a lutar. https://sindipetrosp.org.br/na-ditadura-e-na-pandemia-ha-muita-dor-mas-tambem-muitos-dispostos-a-lutar/ Acesso em 23 de agosto de 2020.
SOBREIRA. José Alfredo Silva Melo. A oposição à ditadura militar em canções da MPB: uma análise da interação entre letra e música. Dissertação de Mestrado, Universidade Federal da Grande Dourados Faculdade de Comunicação, Artes e Letras Programa de Pós-Graduação em Letras Literatura e Práticas Culturais .
MEYER, Dagmar E. Estermann et al . "Você aprende. A gente ensina?": interrogando relações entre educação e saúde desde a perspectiva da vulnerabilidade. Cad. Saúde Pública, Rio de Janeiro , v. 22, n. 6, p. 1335-1342, June 2006 . Available from <http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0102-311X2006000600022&lng=en&nrm=iso>.accesson 27 Aug. 2017. http://dx.doi.org/10.1590/S0102-311X2006000600022.
SCHWARCZ, Lilia Moritz. Governo Bolsonaro é “estado de golpe”. Agência Pública Disponível em: https://apublica.org/2020/08/governo-bolsonaro-e-estado-de-golpe-afirma-historiadora-lilia-schwarcz/ Acesso em 23 de agosto de 2020.
VIEIRA, Cristina Mesa et al. COVID-19:
The forgotten priorities of the pandemic. Maturitas, 2020. DOI: https://doi.org/10.1016/j.maturitas.2020.04.004
Interessante o uso da poesia, que ilustra mas não substitui a análise realizada, boa opção de construção! Ainda assim não entendi a proposta de finalização do texto, parece-me que ficou em aberto.
ResponderExcluirExcelente introdução poética! Boas discussões . Concordando com Pimpona: faltou um fechamento no texto.
ResponderExcluirÓtima retomada da canção de Chico Buarque, trazendo relações da ditadura e com o momento atual. Gostei do encaminhamento de que vulnerabilidade não é só uma questão de minorias ou propensões, mas de fato uma ausência de direitos que coloca cidadãos em vulnerabilidade. E concordo com Pimpona, faltou alguma coisa no final para o fechamento da ideia.
ResponderExcluirA pandemia gera diversas tensões nacionais e internacionais além de gerar prejuízos a todos os setores da economia com consequencias gravíssima para os mais pobres gerando desemprego
ResponderExcluire atingindo os mais vulneráveis economicamente