NADA SERÁ COMO ANTES - GRUPO 5
NADA SERÁ COMO ANTES
Nada
será como antes. Que nada será como antes, Brecht já sabia, o que não
imaginávamos é que esta bendita e assertiva frase, seria tão concreta nestes
dias que atravessamos em 2020. A economia mundial em contexto de pandemia
mudou, afinal, é o maior rombo nos cofres públicos e privados da história contemporânea.
A minha pesquisa discute os imaginários possíveis que o audiovisual produzido
pelos sujeitos em privação de liberdade pode disputar. Nesse sentido, questiono
de que forma esse contexto impactou os setores da cadeia produtiva do
audiovisual e do sistema carcerário, aos quais são instrumento e campo de
investigação?
A cultura nunca foi prioridade em um
governo autoritário eleito por defender uma ideologia neofascista que acredita
na arte como mecanismo de controle da população. A pasta do audiovisual no
Brasil, articulada em conjunto com a Ancine (Agência Nacional de Cinema),
sofreu um corte de 45% desde o começo de seu governo, com a Pandemia, as
produções, distribuições e circulações de obras audiovisuais ficaram afetadas,
artistas e povo sem recurso e sem o mínimo de políticas de seguridade trabalhista
para se manterem em isolamento social, o que dificultou o achatamento da curva
da contaminação da doença, colocando o Brasil em 2º lugar no ranking mundial de
atingidos pela Covid-19. Por meio da lei Aldir Blanc com o objetivo de auxiliar
o segmento cultural, foi possível atingir uma parcela desse setor, contudo ainda
está longe de se efetivar.
E o sistema carcerário? Vamos buscar
a produção de um documentário realizado por sujeitos em privação de liberdade
do presídio Carumbé em Cuiabá. Em meio ao contexto da crise sanitária mundial,
maior índice de desemprego e de pessoas na linha da miséria, tal índice se
torna diretamente proporcional ao aumento da violência e crimes cometidos, que
podem em parte estar associados por necessidade de sobrevivência. As cadeias já
lotadas, com a pandemia e sem o Estado para garantir o mínimo de dignidade
social, nos deparamos com um cenário apocalíptico. E pior, o dito “Mito” eleito
e vangloriado por grande parte da população, é o próprio vírus que dissemina a
ideia de que a “gripezinha” que matou mais de 100mil brasileiros, é apenas uma fantasia
da nossa mente para brecar o lucro dos empresários, que na verdade o que
realmente importa é que, o capital vale mais do que todas essas vidas perdidas.
A
questão econômica na pandemia do COVID-19, assim como para o setor audiovisual
e sistema carcerário, trabalhadoras e trabalhadores do campo evidenciam de
maneira mais explícita as desigualdades sócio-políticas e econômicas em nosso
país. Apesar de se tratar de um vírus que pode contaminar qualquer ser humano,
quando se trata de combatê-lo, existem sim diferenças drásticas associadas as
distinções de classes sociais, impondo os efeitos mais severos sobre as vidas
de trabalhadoras e trabalhadores mais pobres, tanto nos centros urbanos como no
campo.
Um
exemplo dessa discrepância é um dado do IBGE[1] que revela que a
Agropecuária é único setor da economia que teve crescimento na pandemia,
chegando a um aumento de 0,6% no primeiro trimestre de 2020 em comparação ao
quarto trimestre de 2019. As exportações do agronegócio ultrapassaram pela
primeira vez a barreira US$ 10 bilhões, em abril de 2020, com destaque para a
produção de soja e arroz. Contudo, neste mesmo setor, entre março e maio de
2020, foi registrado o menor nível de população empregada neste setor desde
2012[2]: em comparação com o
trimestre imediatamente anterior, a redução foi de 2,1% ou de 173 mil pessoas
e, em relação ao mesmo trimestre móvel de 2019, a queda foi de 6,8%, o
equivalente a 580 mil pessoas.
Para além das grandes empresas do agronegócio, é o
trabalho de produtores da agricultura familiar que respondem por mais de 70%
dos alimentos que chegam à mesa de brasileiras e brasileiros. Para essa
população, já com um acúmulo de dificuldades em função de uma série de
desmontes de políticas para o campo, dificuldades na obtenção de insumos e escoamento da produção, o auxílio emergencial,
segundo a pesquisa do Cepea[3] (Centro
de Estudos Avançados em Economia Aplicada), conseguiu gerar um aumento de renda
e reduzir a pobreza, chegando a atingir em junho, 68% dos moradores de
domicílios rurais. Nesse contexto, a atuação de trabalhadoras e
trabalhadores do campo organizados em movimentos sociais e cooperativas,
conseguiram promover uma análise da cadeia produtiva brasileira[4], de modo a organizar e
manter a capacidade de produção, apesar dos desafios logísticos surgidos
durante a pandemia.
Ao manter essas reflexões nesta configuração
de desiquilíbrio fiscal, baixo crescimento econômico, e pouca capacidade de
investimento, que fundamentaram a provação da Emenda Constitucional 95 que
limita por 20 anos os gastos públicos, colocando a partir de 2018 os gastos
federais só poderão aumentar de acordo com a inflação acumulada conforme o
índice nacional de preços ao consumidor amplo (IPCA). Somando-se o quadro de
pandemia pela COVID19 vem agravar esse contexto, voltando novas discussões
sobre essa medida e principalmente os efeitos nocivos de seu desenho para
setores como agricultura familiar, educação, saúde, cultura e esporte.
No olhar ao setor
audiovisual, sistema carcerário e aos trabalhadores do campo, também
vislumbramos um cenário de desafios ao financiamento a projetos sociais
esportivos. Pois o fundo público é o elemento central para concretização das
políticas públicas. Ele opera por duas linhas, por um lado capta recursos da
sociedade, por meio de impostos, taxas e contribuições, e de outro direciona
gastos para as políticas econômicas e sociais5. O Estado, portanto,
apresenta uma dupla função por meio do fundo público: integradora, em que
executa as políticas sociais para integrar as classes dominadas e garantir a
continuidade da ideologia dominante; e econômica, em que são criadas as
condições gerais de produção aos membros da classe dominante6. Essa
dupla função também se expressa pelas políticas públicas esportivas
desenvolvidas pelo governo brasileiro7.
Segundo
dados observados no Siga Brasil e Ipeadata já vivemos o efeito na redução de
investimentos nos últimos PPA em política esportiva relacionada principalmente
dos programas esportivos – PST, PELC e de esporte de alto rendimento – ao
programa temático de Esporte e Grandes Eventos e ao Programa de Gestão e Manutenção
do ME, que hoje não tem mais o status de Ministério e sim de Secretaria
Especial do Esporte, e com a atual conjuntura as perspectivas não são
promissoras e sim muito desafiadora.
O
desafio passa por não ter um ministério para defender seus interesses, o
esporte perde força no atual governo. Na proposta de Lei Orçamentária
Anual (LOA) de 2020, o presidente propôs que o investimento no esporte ficasse
em R$ 220 milhões, praticamente metade dos R$ 431 milhões que propôs
Michel Temer (MDB) na LOA 2019. Na comparação com último ciclo olímpico, o
corte de investimentos é ainda maior. Excluindo os gastos relativos ao legado
olímpico, a redução do investimento na comparação com 2016 é de 74%, ainda sem
levar em consideração a correção monetária.
Sendo
assim os efeitos do combate a pandemia do COVID19 poderá consolidar a saída do
Governo Federal como principal apoiador do Esporte e Lazer em nosso país. Assim
o COB e a iniciativa privada assumem o protagonismo num possível
desenvolvimento de ações e programas voltados para o esporte e lazer, assim
como para os setores da agricultura familiar, áudio visual e sistema
carcerário, entidades e empresas podem vislumbrar e ocupar a lacuna deixada
pelo poder público e promover ações capazes de hegemonizar uma perspectiva de
política pública que leve a uma estagnação, ou a promoção de uma lógica
sustentada no lucro e na exploração de trabalhadores e atendidos nestes
setores.
Fica clara a necessidade
de manter a lutar para que o esporte seja garantido como direito a população, a
começar por mais investimento com a prática esportiva, uma vez que os
interesses econômicos têm sido colocados em primeiro plano, e os projetos
sociais esportivos podendo ficar cada vez mais dependentes de fontes indiretas,
cujo recursos são provenientes de desoneração tributária, compostas por
patrocínios e doações de pessoas físicas e jurídicas no apoio direto ao esporte
a título de isenção fiscal, desoneração de entidades esportivas sem fins
lucrativos, isenção de impostos na importação de equipamentos e materiais
esportivos, isenção de impostos na importação de equipamentos e materiais
esportivos, isenção de impostos nas importações de bens recebidos como
premiação em evento esportivo realizado no exterior ou de bens para serem
consumidos, distribuídos ou utilizados em evento esportivo no país.
Essa luta na perspectiva
de avançar no financiamento em políticas públicas, para além de um quadro
majoritário por fontes indiretas, também se fortalecerá nos setores da
agricultura família, áudio visual e sistema carcerário.
[1] https://www.gov.br/agricultura/pt-br/assuntos/noticias/agropecuaria-e-unico-setor-com-crescimento-na-pandemia-diz-ibge
[2]
https://jornal.usp.br/atualidades/pandemia-pode-ter-influenciado-reducao-de-empregados-na-agropecuaria/
[3] https://www.cepea.esalq.usp.br/br/releases/especial-cepea-em-meio-a-pandemia-auxilio-emergencial-aumenta-a-renda-e-reduz-a-pobreza-no-brasil-rural.aspx
[4] https://www.redebrasilatual.com.br/cidadania/2020/03/agricultura-familiar-luta-para-garantir-abastecimento-mesmo-com-pandemia/
5 Salvador E. Financiamento
tributário da política social no pós-Real. In: Salvador E, Behring ER,
Boschetti I, Granemann S, editors. Organizadores. Financeirização, fundo
público e política social. São Paulo: Cortez; 2012. p. 123-52. [ Links ]
6 Mandel E. O capitalismo tardio. São Paulo: Abril Cultural; 1982. Capítulo 15, O Estado na fase do capitalismo tardio; p. 333-50. [ Links ]
7 Mascarenhas F, Athayde PFA, Santos MR, Miranda NN. O bloco olímpico: Estado, organização esportiva e mercado na configuração da agenda Rio 2016. Jornal Alesde. 2012 Jul/Dez;2(2):15-32. [ Links ]
Trouxeram vários pontos inter-relacionados com o atravessamento econômico, mas não observei uma conjunção entre estes pontos. Fica como sugestão para a próxima tarefa!
ResponderExcluirFaltou identificar os componentes do grupo, (e retirar grupo 5) .
ResponderExcluirBrecht se mostra atual, e necessário num momento que, mais do que de costume, a cultura é subjugada, e que no contexto da pandemia - que como vocês afirmaram, está explicitando as desigualdades no país.
ResponderExcluir"A paralisação em razão da COVID-19 tem, portanto, múltiplos impactos para a indústria audiovisual: compromete o emprego e a renda dos trabalhadores; gera custos adicionais e perda de fontes de financiamento para as empresas num cenário em que muitos projetos já estavam com sua arquitetura financeira comprometida pelos atrasos na liberação dos recursos oriundos do fomento federal; pode tornar obsoletos roteiros desenvolvidos antes da pandemia; desequilibra as relações de poder entre os diferentes players do mercado e desorganiza a cadeia produtiva, gerando atrasos e dificuldades na produção, exibição e distribuição que vão além do período de distanciamento social em si" (MUNIZ e VIEIRA, 2020).
ResponderExcluirMediante essas considerações, e através dos apontamentos do texto do Grupo 5 é perceptível que o audiovisual brasileiro está atravessando um momento muito delicado, sendo necessário e urgente políticas públicas que contemplem esse campo da cultura.
Parabéns a todos pelo texto!
REFERÊNCIA
MUNIZ, A.; VIEIRA, L. Política audiovisual em tempos de COVID-19: arte e indústria em confinamento. Disponível em: http://anesp.org.br/todas-as-noticias/2020/5/22/poltica-audiovisual-em-tempos-de-covid-19-arte-e-indstria-em-confinamento. Acesso em: 19/08/2020.
ResponderExcluirO certo é: um vírus que pode contaminar a toda população e sutilmente abalar a economia de forma geral.
Não há de se estranhar que pequenas empresas não conseguiram se manter por falta de fluidez, já o agronegócio teve aumento durante a pandemia, isso ocorre devido a créditos, incentivos e força política.
Senti falta de saber quem são os componentes do Grupo 5: pelo perfil de cada um podemos perceber as relações que cada componente traz ao trabalho.
ResponderExcluirBoas fontes pesquisadas. Excelentes reflexões. Texto muito bem construído.