A CIDADE, A CASA, O TRABALHO E O ESTUDO: ALGUNS EFEITOS SOCIAIS ORIUNDOS DA PANDEMIA DE CORONAVÍRUS
Autores: Ana Cláudia Vitório de Carvalho Goés; Danielle Ferraz Garcia; Everton Nazareth Rossete Junior; Manoel Antônio de Oliveira Rosin. (GRUPO 01)
Devido a enorme desigualdade social em nosso país, a pandemia do Covid-19 afetou ainda mais as condições de vida dos menos favorecidos, a adaptação ao novo estilo de vida e as dificuldades encontradas na cidade para o cidadão, como sair de casa para trabalhar, ou trabalhar em casa e estudar, causam efeitos irreversíveis na sociedade.
A pandemia causou impactos profundos em todas as esferas do viver humano, uma delas foi na relação do homem com a cidade. Através dessa relação, pode-se perceber a importância de aspectos renegados há anos e até mesmo há séculos, sendo o principal deles, o planejamento urbano.
Sabe-se que o planejamento urbano é uma ferramenta essencial para a qualidade de vida do habitante dos centros urbanos e a pandemia ressalta os problemas advindos da falta deste. Para contenção da propagação do vírus, são necessárias várias medidas sanitárias que tem sido fortemente difundidas pela Organização Mundial da Saúde e pelo poder público, entre elas a de distanciamento social e higiene pessoal. No entanto estudos revelam como a desigualdade social e a falta de planejamento urbano dificultam a adoção de tais medidas e portanto, atingem com maior intensidade a população pobre (OLIVEIRA, 2020).
Dentre os fatores que contribuem para essa intensificação, está a dificuldade de acesso à infraestrutura urbana, onde a população se vê carente de serviços essenciais à vida e saúde como água e esgotamento sanitário; a dificuldade de acesso ao transporte, onde através de ônibus lotados, a população de baixa renda se vê exposta à contaminação e propagação do vírus; à problemas habitacionais como a alta densidade nas periferias urbanas (BERG, 2020; OLIVEIRA,2020), onde na maioria das edificações existe mais que uma pessoa por dormitório, o que dificulta as medidas de isolamento social, até mesmo de pessoas comprovadamente infectadas, além de que com residências de dimensões mínimas, muitas vezes sem condições adequadas de saneamento, as ruas tornam-se uma extensão do habitar e é onde se encontram o lazer e socialização, promovendo assim a movimentação intensa de pessoas (OLIVEIRA, 2020), além da dificuldade de acesso aos serviços essenciais promovida pela localização físico espacial dos equipamentos de saúde, cultura e lazer, onde a dificuldade de acesso aos equipamentos de saúde torna-se um dos fatores que contribuem para o crescimento das taxas de mortalidade devido ao Covid-19.
É preciso, portanto, repensar as cidades e implementar um planejamento urbano cada vez mais atento aos problemas sociais, de forma que as cidades se tornem resilientes, não no sentido literal de algo que é capaz de retornar ao seu estado original, mas segundo Depiné (2020), como uma cidade que tem a “capacidade de absorção, recuperação e preparação para choques futuros”.
Assim como nas dinâmicas sociais afetadas pelas imposições de alteração de usos do espaço urbano, na escala das edificações, os espaços físicos das habitações também têm sofrido impactos que alteram as dinâmicas de convívio social dentro das residências (ou sofrido alterações nas dinâmicas de convívio e sociabilidade dentro de casa que impulsionaram transformações físicas nos espaços).
Recomendações de autoridades da saúde sobre evitar aglomerações e ficar em isolamento social direcionaram as pessoas a produzirem adequações, adaptações e/ou transformações em suas residências – pelo menos às parcelas minimamente privilegiadas que possuem condições para tal. “As recomendações vão desde a ventilação natural dos ambientes e superfícies e organização de espaços de isolamento em casa, até a utilização de maçanetas e torneiras que permitam a abertura com o cotovelo.” (CAUBR, 2020)
Desde adequações simples, como separar na entrada de casa uma mesa ou bancada para álcool gel, uso de toalhas de papel nos banheiros para evitar o compartilhamento ao secar mãos e rostos, até reformas de cômodos que deixam (temporariamente ou não) seu uso inicial para se tornarem escritório e/ou salas de aula. Fato é que as dinâmicas entre trabalho, descanso, locomoção e lazer são alteradas e impactam diretamente o convívio social entre moradores de uma mesma casa. Crianças encontram sua circulação muitas vezes restritas, vetadas a ambientes agora de trabalho dos adultos – ou o inverso, onde crianças precisam se isolar também dos demais moradores, para poder realizar seus estudos, sejam por livros, apostilas, ou havendo condições, computadores e dispositivos móveis.
Muitos destes impactos, espaciais e sociais, devem permanecer após o fim da proliferação da pandemia. Segundo o professor André Miceli, da Fundação Getúlio Vargas (FGV)
[...] a adoção emergencial do home office por diversas empresas como medida para reduzir o contágio do coronavírus deve provocar uma mudança nas culturas organizacionais. Para ele, a modalidade é um caminho sem volta. (UOL, 2020)
As mudanças espaciais e as dinâmicas de trabalho afetam as dinâmicas sociais a elas relacionadas. Assim como escritórios, espaços e dinâmicas educacionais também são afetadas, trazendo novamente à tona discussões como o ensino domiciliar.
Uma das relações mais afetadas pela pandemia de Covid-19 foi a de professores e alunos. Na história recente, nada abalou mais essas figuras do que o afastamento do convívio social presencial. Os ambientes de ensino eram até então estruturados nos pilares da interação entre docentes e discentes. Abruptamente, o cenário foi decomposto e as aulas interrompidas e o que se conhecia como ambiente de ensino e aprendizagem de repente viu-se incompatível com a nova vida de confinamento.
Os transtornos gerados, até então imensuráveis, começaram a aparecer diante da necessidade de retomar o ensino de maneira remota. As instituições privadas foram as primeiras a direcionar os seus alunos para as aulas online, muitas tiveram que se adaptar do dia para a noite, gerando dificuldades e inseguranças em toda a cadeia acadêmica. Os professores, peças tão fundamentais no processo de ensino, foram direcionados (ou quase forçados) a olharem para a câmera mais próxima e a partir daí ministrar todo o seu conteúdo. Ao longo dos dias e semanas observou-se que o ensino remoto até pode quebrar um certo galho, mas está longe de ser a maneira ideal de aprendizagem. As rápidas mudanças, os altos níveis de cobranças e a frustração gerada pelas aulas remotas foram sentidas por muitos professores:
O excesso de trabalho, o agravamento do estresse, ansiedade, insônia e outros sintomas relacionados com a saúde mental são relatos comuns entre os professores durante a pandemia da covid-19 (SALAS, 2020).
Na outra ponta, alunos desmotivados deixaram de ter a produtividade de antes, isto ao tratar-se daqueles privilegiados que possuem acesso à internet e a um dispositivo móvel ou computador. As desigualdades sociais e econômicas ficaram muito mais evidentes com a pandemia, alunos de instituições públicas em sua maioria não têm acesso a equipamentos e tecnologias que permitem o acompanhamento das aulas online, e muitas escolas públicas não conseguiram ofertar este tipo de aula.
Muitos estudantes não têm condições de assistir às aulas pela falta de equipamento ou de acesso à Internet, por não ter um espaço em sua casa ou por estarem preocupados com o adoecimento de pessoas na sua família, porque os familiares dos mais pobres não puderam parar de trabalhar. Diversos fatores levam a não ter condições de acompanhar as aulas. (ADUSP, 2020)
Os impactos sociais que envolvem a sistemática de ensino talvez não sejam tão claros ainda, uma vez que a pandemia ainda está latente e sem previsão de encerramento, as aulas online seguem acontecendo e o cenário desenhado pelas desigualdades segue posto e em franco desdobramento. Sem perspectivas de melhora, alunos e professores seguem sem rumo no desconhecido e impalpável futuro educacional do país.
Vemos assim, que quando se trata dos efeitos causados pelo covid-19 a população de baixa renda, seja na cidade, no trabalho ou nos estudos sofrem muito mais com essas adaptações por não possuírem condições ou por não terem os meios que facilitam a nova forma de vida humana. Restando apenas a resiliente expectativa de sobreviver a todos esses efeitos sociais.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS:
ADUSP. Falta de condições de acompanhar as aulas online força estudantes a desistirem de disciplinas e prejudica os mais pobres. Associação dos Docentes da Universidade de São Paulo, [S. l.], p. 1-4, 28 abr. 2020. Disponível em: https://www.adusp.org.br/index.php/defesauniv/3649-falta-de-condicoes-de-acompanhar-as-aulas-online-forca-estudantes-a-desistirem-de-disciplinas-e-prejudica-os-mais-pobres. Acesso em 11 set. 2020.
BERG, Rogier van den. Planejamento urbano e epidemias: os efeitos da Covid-19 na gestão urbana. WRI Brasil. Disponível em: <https://wribrasil.org.br/pt/blog/2020/04/planejamento-urbano-e-epidemias-os-efeitos-da-covid-19-na-gestao-urbana#:~:text=A%20implementa%C3%A7%C3%A3o%20de%20ferrovias%20teve,espraiados%2C%20criando%20vastas%20%C3%A1reas%20urbanas.&text=A%20epidemia%20da%20Covid%2D19,forma%20significativa%20a%20vida%20urbana>. Acesso em 12 de set. 2020.
CONSELHO DE ARQUITETURA E URBANISMO DO BRASIL. Arquitetos fazem ‘cartilha’ para colaborar na redução da disseminação do coronavírus. CAUBR. Disponível em: <https://caubr.gov.br/arquitetos-fazem-cartilha-para-colaborar-na-reducao-da-disseminacao-do-coronavirus/> Acesso em 11 set.2020.
DEPINÉ, Ágatha. Resiliência urbana e o impacto da Covid-19 nas cidades. VIA – Estação conhecimento. Disponível em: <https://via.ufsc.br/resiliencia-urbana-covid-19/>. Acesso em 12 de set. 2020.
OLIVEIRA, Sandro B. DESIGUALDADES URBANAS NA PANDEMIA. Impactos da Covid-19 nas periferias. Le Monde Diplomatique Brasil. Disponível em: <https://diplomatique.org.br/impactos-da-covid-19-nas-periferias/>. Acesso em 12 de set. 2020.
SALAS, Paula. Ansiedade, medo e exaustão: como a quarentena está abalando a saúde mental dos educadores. Nova Escola, [S. l.], p. 1-18, 1 jul. 2020. Disponível em: https://novaescola.org.br/conteudo/19401/ansiedade-medo-e-exaustao-como-a-quarentena-esta-abalando-a-saude-mental-dos-educadores. Acesso em 11 set. 2020.
UOL. Home office deve crescer 30% no país após coronavírus, diz professor da FGV. Disponível em: <https://economia.uol.com.br/empregos-e-carreiras/noticias/redacao/2020/04/06/home-office-coronavirus.htm> Acesso em 11 set. 2020.
O grupo foi hábil em escolher apenas autores que publicaram em 2020. Parece uma obviedade, mas certamente foi uma decisão deliberada. Algo notável.
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